Foto de Mariana Conde |
Diga que levantou-se, lavou o rosto e teve coragem de olhar-se no espelho enquanto escovava os dentes.
Diga que abriu a janela e deixou a luz entrar. E que fez a cama.
Diga que colocou pelo menos uma peça de roupa colorida.
Diga que penteou os cabelos e passou perfume. E que calçou sapatos, não pantufas.
Diga que tomou café da manhã, e sentiu seu gosto.
Diga que ouviu o barulho dos próprios passos enquanto caminhava até o carro. E que o fez sem óculos escuros.
Diga que ligou o rádio, sem medo das músicas que pudessem tocar.
Diga que foi, sim, trabalhar, e que quase ninguém notou nada de diferente. E que a única pessoa que notou, respeitou seu silêncio, mas ofereceu colo, se lhe quiser contar.
Diga que deu "Bom Dia", atendeu ligações, reclamou de algo, resolveu coisas, mexeu-se.
Diga que na hora do almoço, não comeu só salada nem tomou só água. E que perdoou-se por ter aceito a sobremesa.
Diga que a tarde passou surpreendentemente rápido, como qualquer outra.
Diga que ao voltar para casa, demorou-se um pouco mais no banho quente. E que usou uma toalha seca e macia para se enxugar.
Diga que vestiu uma roupa, não um roupão.
Diga que não se sentou em frente à TV só para ouvir uma voz qualquer. E que lembra de pelo menos uma notícia do telejornal.
Diga que jantou e depois tomou um licor, ou comeu um bombom.
Diga que escovou os dentes antes de deitar.
Diga que não manteve o abajur aceso por medo de pesadelos.
E que o silêncio da noite não lhe fez ensurdecer com os próprios pensamentos.
E diga que logo antes de adormecer, permitiu-se um suspiro de alívio. Porque sabe que haverá na vida outros dias seguintes. Mas que este, felizmente, já terminou. Boa noite.
Nossa! Chorei.
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