quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

De tudo aquilo que não sei

Um ano se passou desde que escrevi pela última vez. Hoje, exatamente um ano depois, reabro meu blog.

Faço-o - como é costume, desde que comecei a escrever - com pedidos e agradecimentos ao Senhor do Tempo, que fecha 2015 e traz 2016 à nossa porta.


De tudo aquilo que não sei


"Com o devido tempo, nada é mais mutável do que as rochas."
Enos Mills, naturalista americano

Devil's Golf Course, uma inacreditável formação de cristais de sal, no meio do deserto.
Death Valley, California. Foto do autor, de Outubro de 2015.

Quero continuar a escutar sons que desconheço, de idiomas que não sei identificar;
Ouvir por ouvir, para que as palavras fluam adentro como notas musicais, sem significado.
Quero mais mantras que se repitam e repitam e repitam,
Que meus ouvidos escutem, mas meu cérebro não entenda.
Quero ouvir só com a alma.

Quero a suavidade das vogais doces, de alguma língua indígena muito antiga
E cadeias complexas de consoantes impronunciáveis, que deem textura aos ouvidos
E me recordem daquilo que já fui e vivi há muito tempo - mas ainda não consigo me lembrar.

Quero agradecer pelas caminhadas por lugares em que nunca estive
E a revisita a outros, reverenciando a jornada.

Quero vagar por onde nada há, para me sentir pleno.
Quero me perder, para depois rastrear meus próprios passos.

Quero galhos secos, ou jardins cobertos de flores e animais cantando.
Quero eternizar na lembrança, o improvável: a chuva inundando o deserto esculpido pelo sal.
Quero pântanos, florestas, gelo, água, fogo.
Quero descer até o rio teimoso, que corre esculpindo a pedra e traçando seu caminho,
Ou ver as pedras polidas, inertes e eternas, no fundo do rio que já não corre mais.
Quero de novo deitar na neve
E na rocha quente, dourada, cor de alegria.

Quero continuar a caçar pôres-do-sol e alvoradas
E acordar com uma vontade incrível de sei-lá-o-quê.
Quero pegar a estrada de lá para cá
E imaginar orações em um pequeno altar de pedras, construído à sombra de uma árvore,
E sob a luz de um sorriso.

Quero finalmente encontrar velhos amigos que ainda não conheço.
Quero tempestades de alegrias.
Quero meus braços se movendo por não serem mais meus.
Quero rodopiar com os pés inundados de uma alegria desconhecida, mas minha desde sempre.
Quero meu rosto irreconhecivelmente sereno. Ou respeitosamente severo.

Quero um sotaque enrolado, para dizer somente o necessário, com a devida simplicidade.
Quero meu corpo adormecido e minhas ideias aladas.
Quero mais lágrimas gratas, que escorram límpidas, sem que o rosto se contraia
E sem que ninguém as precise secar.

Quero ser meio, quero ser objeto, quero servir.
Quero ser morada e trampolim.
Quero ser porto. Mas também quero ser barco.

Quero agradecer os abraços longos e silenciosamente eloquentes
E beijar muitas mãos, ajoelhar-me com os lábios.
Quero gente de todas as cores.

Quero que cada vez menos coisas façam sentido.
E mais continuem a se tornar indispensáveis,
Ainda que inexplicáveis.

Quero tudo aquilo que não sei;
Que o novo me torne cada vez mais jovem
E o tempo continue a me fazer cada vez mais ignorante.

Que 2016 seja um ano novo.
Ininteligível à cabeça, mas claríssimo ao coração.

2 comentários:

  1. Uauhhhh.....perfeito!
    Sintetizando: Quero Viver!!!
    Simples assim.
    Um grande beijo,

    Martha

    ResponderExcluir
  2. Que suas belíssimas palavras e ponderações poéticas lhe apresentem e auxiliem o seu caminhar de 2016!! Perfeito!!

    ResponderExcluir

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